sexta-feira, 10 de abril de 2009

O encontro de Jesus com Pilatos

*IVAN RAFAEL BUENO


Desde o início da minha faculdade de Direito na cidade de Franca, coloco-me a escrever artigos para propalá-los. E os assuntos esquadrinhados e abordados neles sempre estiveram inerentes e presos ao mundo jurídico. Em razão de novas experiências pessoais, decidi, então, escrever algo diferente e, por conseguinte, vieram-me indagações.

O que eu poderia escrever para uma sociedade em que a maioria das pessoas valorizam o ter e menosprezam o ser? O que poderia escrever num país em que milhares de universitários são ludibriados por instituições de ensino que não reúnem as mínimas condições para funcionar? O que eu poderia escrever num país em que a televisão e a internet substituíram o papel da escola e da família e hoje são as principais formadoras do caráter de nossas crianças? O que eu poderia escrever para uma sociedade em que muitos pais estimulam seus filhos adolescentes a manter relações sexuais dentro de casa e depois esses mesmos genitores recusam-se a pagar pensão alimentícia aos netos concebidos da gravidez indesejável e irresponsável? O que se poderia escrever num país em que os noticiários trazem todos os dias à tona novos casos escabrosos e estarrecedores de pedofilia? O que se poderia escrever numa época em que igrejas funcionam como empresas? O que escrever num país em que a corrupção já acometeu e atingiu os mais altos e diferentes escalões da Administração Pública? O que poderia eu escrever para uma sociedade em que o racismo ainda existe e é dissimulado? Enfim, qual mensagem poderia ser propalada numa sociedade em que a desordem, a injustiça e a inversão de valores substituíram a ordem, a eqüidade e a honestidade?

Pela primeira vez, arredei e rechacei os temas jurídicos para dar lugar a algo que as minhas as minhas aulas de filosofia e os meus livros de direito não foram capazes de ensinar-me.
“À coup sûre” (do francês: sem dúvida alguma), sinto-me “à plaisir” (também do francês: à vontade) para falar de uma passagem bíblica na qual o mestre e salvador “Agnus Dei” (do latim: Cordeiro de Deus), antes da crucificação, disse a Pilatos: “Todo aquele que é da verdade ouve minha voz”. Diante, então, da afirmação do Cristo, perguntou-lhe o presidente: “Que é a verdade?”. Todavia, Pilatos não quis esperar a resposta de Jesus, dando-lhe as costas e determinou ainda que se escrevesse em cima da cruz um título “Este é o Rei dos Judeus” em letras gregas, romanas e hebraicas.

Pilatos, embora fosse homem letrado e culto, ignorou a verdade trazida por Cristo Jesus, pois conhecia apenas o conceito temporal de “verdade” dos homens de sua época. Sabia Pilatos que a verdade para o grego (“aletheia”) era um conceito ligado ao presente; e que para os romanos (do latim “veritas”) era um conceito inerente ao passado, ligado a um fato preexistente e, por fim, sabia que, no hebraico (“emunhah”), o conceito de verdade estava relacionado ao futuro. Por isso, foi o título sobre a cruz escrito em três línguas.

Quem vive “à la lettre” (do francês: à letra), não consegue compreender a verdade revelada por Jesus e caminha para fenecer, porquanto a letra mata (alusão à morte espiritual). A verdade pregada por Cristo não se referia ao conceito humano temporal; não era a verdade de ontem, de hoje e tampouco a de amanhã. Era a verdade para a vida eterna, para a salvação, ou seja, era um conceito que se perpetuaria. No entanto, o presidente Pilatos, tal como acontece nos dias de hoje, não quis ouvir a verdade divina, crucificando-a, pois, em seu coração.

Atualmente, muitas pessoas não conseguem enxergar além da letra, pois preocupadas se encontram apenas com suas vaidades e com seus conceitos humanos; presas às suas filosofias arcaicas e escravas de sua própria necedade, menosprezam a verdade revelada, que somente pode ser entendida com o exercício incondicional da fé.

Como bem dito pelo Rei Salomão, “stultorum infinitus est numerus (do latim: o número dos estultos é infinito). E lamento muito ao perceber que ainda há alguns que vêem nas placas e denominações das inúmeras igrejas que por aí existem o caminho para a vida eterna, quando, na verdade, o Filho é o único caminho que leva ao Pai. Não imite Pilatos! Quem tem ouvidos, ouça!

*advogado criminalista, especialista em direito público pela Universidade Potiguar e ex-membro do Conselho Municipal de Segurança Pública

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